Alagoas é um dos estados do país com menor crescimento populacional no último ano, de acordo com as Estimativas da População residente nos municípios brasileiros, divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa tem como data de referência o dia 1º de julho deste ano, e pode causar impactos na vida financeira dos municípios, mas tem ressalvas da Associação dos Municípios Alagoanos (AMA).
Comparando com os resultados da mesma pesquisa no mesmo período de 2024, mais da metade dos municípios alagoanos registrou redução populacional. Apesar de não ter reduções significativas, a maior queda foi em Campo Alegre, que perdeu 0,48% da sua população, os números preocupam os gestores porque impactam nos recursos que chegam através do Fundo de Participação dos Municípios. O estado, de forma geral, apresentou um crescimento baixo, de apenas 0,02%, o mais baixo do país, empatado com o Rio de Janeiro.
Os municípios que tiveram as maiores perdas de população foram Campo Alegre, com queda de 156 habitantes (-0,48%), Atalaia com 50 habitantes a menos (-0,13%), Joaquim Gomes caiu em 44 habitantes (-0,25%) e Boca da Mata, que agora tem uma população menor em 38 habitantes (-0,18%).
De acordo com Marcelo Beltrão, presidente da Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), o resultado apresentado pelo Censo vem sendo questionado pelos gestores.
“A questão do FPM é uma questão que foi refletida por conta do Censo. A contagem apontou essa queda populacional. Mas alguns prefeitos têm pedido para a AMA interferir no sentido de fazer uma recontagem, até porque eles não reconhecem o número que foi apresentado pelo Censo, e nessa revisão a gente acredita que chegue aos números reais”.
A alegação dos gestores é de que na prática os serviços públicos são utilizados por um número maior de pessoas. “A solicitação dos municípios é para que haja uma recontagem, porque a maioria deles não reconhece o número que foi apresentado. Eles trabalham com uma população maior nas suas políticas públicas de educação, de saúde. O censo real não reflete o resultado que foi dado pelo IBGE”.
A articulação junto aos deputados federais vem acontecendo desde a divulgação inicial dos números do Censo de 2022, e segundo Beltrão já ajudou a reduzir o impacto.
“Muitos prefeitos estão reclamando que tem mais população do que foi apontado no Censo, então a gente está observando isso com muita preocupação. A queda de receita foi amenizada por um movimento da bancada federal, porque antigamente o FPM caía de faixa abruptamente. Pela nova legislação, que foi mudada após essa contagem do Censo, ela partiu para fazer um décimo em cada ano, então, o primeiro ano, os municípios que caíram, já perdeu 10%, o segundo ano já perdeu 20%, o terceiro ano já vai para 30%”.
De acordo com o IBGE, os dados da estimativa são utilizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no cálculo do Fundo de Participação de Estados e Municípios e são fundamentais para indicadores econômicos e sociodemográficos nos períodos entre o Censo Demográfico. A pesquisa também considera alterações de limites territoriais que ocorreram após o Censo 2022.
Em dezembro de 2024, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou anteprojeto de decisão normativa que fixa, para o exercício de 2025, as quotas de distribuição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) previstas na Constituição Federal. De acordo com o documento, o Tribunal realizou o cálculo do Coeficiente Individual do FPM (CIFPM) para cada municipalidade a partir dos dados de população e renda per capita.
A base legal para distribuição dos recursos é a Lei 5.172/1966, em que 10% vão para a capital e os outros 90% para o interior, de acordo com o número de habitantes. São destinados 4% exclusivamente aos municípios com população igual ou superior a 142.633 habitantes, o que em Alagoas contempla apenas Arapiraca.
A lei prevê que os limites das faixas de número de habitantes “serão reajustados sempre que, por meio de recenseamento demográfico geral, seja conhecida oficialmente a população total do País, estabelecendo-se novos limites na proporção do aumento percentual daquela população, tendo por referência o recenseamento imediatamente anterior”.
Outra coisa que também é definida com base no número de habitantes da cidade, são as cadeiras de vereador na Câmara Municipal. Há um número mínimo de nove vagas para os municípios de até 15 mil habitantes, sendo que acima disso há um crescimento. Nas eleições de 2024 já houve efeito das mudanças do Censo de 2022, realizado pelo IBGE. Um caso de muita repercussão em Alagoas foi a cidade de Anadia, que tinha 11 vagas e caiu para nove, mas por um erro da Câmara informou duas vagas a mais à Justiça Eleitoral. Duas candidatas chegaram a ser consideradas eleitas, mas não assumiram por conta dessa redução. Considerando apenas as mudanças entre 2024 e 2025, nenhum município teve alteração nesse quadro.
Instituto descarta possibilidade de recontagem das populações
Em contato com a Tribuna Independente, o superintendente do IBGE em Alagoas, Alcides Tenório, garante que não é possível refazer a contagem do recenseamento só aqui do estado.
“Não há possibilidade de se fazer porque por princípio, por critério principal, um censo só pode ser feito com uma fotografia instantânea tirada de toda a sociedade ao mesmo tempo. Porque se eu tirar fotografias em tempos diferentes, as pessoas se movimentam. Então eu posso acabar contando a pessoa de um lado e depois contando o outro. Ou essa pessoa pode ter se movimentado num momento e eu não pego ela em lugar nenhum”, afirmou Tenório.
O superintendente detalha o processo de entrevista. “Então, por princípio, você tem uma data de referência que foi 1º de agosto de 2022. E nessa data de referência você faz o censo durante alguns meses depois, mas sempre fazendo a pergunta para aquele dia. Quantas pessoas residiam no domicílio na virada do dia 31 de julho para o dia primeiro de agosto de 2022? Ou seja, quantas pessoas estavam ali dormindo no domicílio naquele momento, aquele é o momento instantâneo que você faz a pergunta para aquele momento. Com isso você ajuda, garantindo que tudo seja fotografado ao mesmo tempo. Isso vale para o Brasil inteiro”.
Certificando a precisão dos dados, Alcides considera que em termos de recursos e de tempo para trabalhar os dados, esse censo pode ter sido o mais bem minucioso em Alagoas. “Nós aplicamos o senso mais tecnológico de todos os tempos. Isso significa dizer que nós tivemos os melhores sistemas todos integrados em tempo real para encontrar com auxílio de imagens de satélite e GPS de precisão os domicílios. Nós já referenciamos todos os domicílios do Estado e fizemos isso tanto na zona urbana quanto na zona rural”.
“Cada domicílio já visitado tem um questionário associado a ele com as pessoas que moram lá. Então, quando nós fizemos esse trabalho, nós temos esse banco de dados e nós acompanhamos isso o censo inteiro. Nós conseguimos muitos recensores, então iniciamos o trabalho em 1º de agosto de 2022 e finalizamos o trabalho de coleta propriamente dito já no final de outubro, início de novembro, que é mais ou menos o prazo original que nós tínhamos. E até maio de 2023, em pelo menos seis meses, nós ficamos burilando o trabalho para tentar encontrar eventuais inconsistências retificar e melhorar a qualidade do trabalho. Então eu posso afirmar categoricamente que além de mais tecnológico esse foi o senso com maior qualidade que já foi feito no Estado”.
A constatação da redução populacional em municípios alagoanos chamou atenção dos técnicos durante a realização do censo. Segundo Alcides, houve uma atenção maior para esses lugares e diálogo com a própria AMA.
“Provocamos uma reunião na AMA quando identificamos que muitos municípios iam perder população e provavelmente FPM. Quando provocamos a AMA, eles nos atenderam gentilmente, fizemos uma importante reunião na AMA na época, levei todo o corpo técnico para explicar, principalmente para os municípios que poderiam vir a perder FPM, estar em uma situação pior, o que está acontecendo. E lá nós definimos duas etapas adicionais de controle e qualidade. Realizamos um protocolo extra para verificar todas as áreas e demos a oportunidade para os municípios por meio de ofício para eles enviarem para a gente em listagens com todos os domicílios que eles verificassem que houvesse suspeita de que o rastreador não tivesse passado lá”.
“Pesquisas registram redução drástica na taxa de fecundidade”
Sobre a questão dos cadastros dos usos dos serviços e políticas públicas, o superintendente do IBGE esclarece. “Não tem como a gente comparar duas coisas tão diferentes. O uso do sistema de saúde, não quer dizer com toda garantia metodológica que são pessoas residentes efetivamente naquele município. Pode ser a pessoa que tenha um cadastro naquele município, mas que não reside efetivamente naquele município. Por exemplo, pode ser uma pessoa que era do município do interior, constituiu em Maceió a família, tem os filhos estudando no colégio em Maceió, então, essas pessoas residem em Maceió e foram contadas em Maceió. Mas eventualmente vai para o interior e quando vai, se precisar de saúde, acessa. Essa pessoa reside no interior por conta disso? Não”, argumentou Alcides Tenório.
Ele afirma que os pesquisadores buscaram explicações para explicar a redução, e menciona fatores como a queda drástica na taxa de fecundidade nas últimas décadas. “Fizemos análise técnica, utilizando pirâmides demográficas e fazendo a sobreposição delas para o censo de 2000, 2010 e 2022. E nós percebemos claramente que a base dessas pirâmides está diminuindo, significa dizer que nós temos menos pessoas com pouca idade, menos crianças. A população está envelhecendo, é uma tendência mundial, as pirâmides são assim, quando a população envelhece e a base estreita”.
Outro ponto seria possível migração das pessoas de uma faixa etária específica. “A população está envelhecendo, é uma tendência mundial. Só que existe um fator muito peculiar no Nordeste inteiro, mas em Alagoas de forma muito forte. As pirâmides demográficas mostram que ali mais ou menos de 16 a 18 anos, chegando até uns 40 e poucos anos, principalmente entre 28 anos, 30 anos, tanto para homens quanto para mulheres, nós encontramos menos pessoas do que estimávamos encontrar. Nós encontramos idosos, nós encontramos pessoas com menos idade, o que é estimado encontrar, nós encontramos. Por que não encontramos exatamente nessas faixas etárias, né? Por que que nós encontramos poucas pessoas com a faixa, por exemplo, de 30 anos de idade? A metodologia é a mesma, você vai no domicílio e aplica o mesmo questionário. Mas muito provavelmente essas pessoas saíram desses municípios para buscar sua vida em outro local”.